segunda-feira, 22 de setembro de 2014

IRMÃOS(1970), DANCY'N DAY'S (1978) E O BEM AMADO (1973)

Depois de um longo e tenebroso inverno, eu voltei agora pra ficar e continuarmos a tratar de Memória, de História, da nossa história cultural. 
E podemos começar comentando os dvds de novela, que foram lançados em box? Comprei os que me interessou mais, embora a variedade seja relativamente grande... vamos de Irmãos Coragem (1970), Dancy'n Days (1978), O Bem Amado (1973), Selva de Pedra (1973) e Pecado Capital (1975)? Já assisti aos dois primeiros na íntegra, atualmente termino o terceiro, já engatei os dois últimos, nessa ordem, para assistir.
Rita Lee disse, uma vez, que novela é cultura. Fechei de novo com ela. Ainda mais escrita por autores que vieram de uma tradição do teatro ou do radio-novela. Estamos falando da teledramaturgia de Janete Clair e Dias Gomes e do herdeiro mais direto de Clair, Gilberto Braga.
Irmãos Coragem, como apresentou Daniel Filho na abertura do dvd, foi gravado no local onde hoje funciona o Barra Shopping. Dá para imaginar como era a Barra antigamente assistindo à novela, inclusive existe uma cena na qual a personagem Ritinha (Regina Duarte) está por lá e vemos um único prédio sendo construído. Loucura!
O elenco da novela que pretendeu conquistar também o público masculino com a sua estória meio bang bang, na qual irmão honestos lutam contra a maldade de um coronel. Um deles (Tarcísio Meira) encontra um diamante, o que provoca uma grande perseguição a esta sua riqueza.

Na cena urbana, temos Duda (Cláudio Marzo), que só poderia ser Flamengo (a Globo acha que todos os cariocas são).


É interessante perceber algumas questões de 40 anos atrás. Televisão inexistia, no máximo uma vitrola portátil, um rádio, um telefone que só podia ser usado com telefonista... e talvez o melhor de tudo; o show de Glória Menezes interpretando 3 personagens muito distintas, Lara, Diana e Márcia: a primeira, reprimida ao extremo, a segunda, uma feminista devassa e a terceira, um equilíbrio entre as duas. E todos sempre com um cigarro na mão! (Abaixo, Diana e João Coragem).
Nesta época não existia o Projac e as cenas externas eram gravadas na rua. Por isso, é interessante observar como se constituía a cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, que em Dancy'n Days, de Gilberto Braga, elege Copacabana como centro de atenções para narrar a saga de Júlia Lopes (Sônia Braga), ex-presidiária que luta para conquistar o amor da filha (Glória Pires), criada por sua irmã (Joana Fon) que deu um golpe do baú e mora na Avenida Atlântica. O papel de Sônia era para ter sido de Betty Faria, que recém separada de Daniel Filho, não quis participar da novela que o seu ex dirigia. Também o papel de Joana Fon era de Norma Benguel, que gravou alguns capítulos, mas logo abandonou a novela.
Percebi que a casa de Cacá (Antônio Fagundes) ficava mesmo era no Leblon, não em Copa, naturalmente já veio abaixo há tempos.
Atualmente reprisada pelo Canal Viva, lançou a moda da discoteque pegando o nome emprestado de Nelson Motta, que, segundo afirmou em Noites Tropicais, ao tentar recriar o ambiente no Morro da Urca, sofria por explicar às pessoas que os artistas da novela não estariam lá...
A que estou vendo atualmente é O Bem Amado. Um dos melhores textos de novela já escritos, sátira em pleno anos 70 de ditadura militar, sendo Dias também comunista de carteirinha. 
A primeira novela a cores das 22 horas trazia Odorico Paraguassu (Paulo Gracindo), um político corrupto da imaginária Sucupira, que fora casado com uma Cajazeira já falecida, sendo, atualmente, amante das três irmãs solteiras da cidade que viviam hipocritamente debaixo do slogan da família, da moral e dos bons costumes. Quem não se lembra que Odorico engravidou Dulcinéia (Dorinha Duval), arquitetando um plano terrível para que ela casasse com Dirceu Borboleta (Emiliano Queiroz), que havia feito voto de celibato? Essa é uma das menores canalhices que ele aprontou na novela.
Havia uma oposição entre os Cajazeiros e os Medrados, incentivada por Odorico que tenta de todas as formas inaugurar o cemitério e recuperar a imagem arranhada pela oposição, que denuncia seus gastos abusivos. Para isso, manda vir para a cidade o jagunço Zeca Diabo, na verdade já regenerado, que havia virado assassino em função de slavar a honra de sua irmã. 

Fazem parte dos que se opõem a ele o jornalista interpretado por Carlos Eduardo Dolabela, que se apaixona por Telma (Sandra Brea), a delegada Medrado (Zilka Salaberry) e o médico Juarez (Jardel Filho), que para a desgraça de Odorico, se envolve com Telma. O teor político desta novela é impressionante, com o doutor Juarez liderando motins, passeatas e uma série de rebeliões que incomodavam por demais a censura, que também não gostava nada do assanhamento das irmãs Cajazeiras com o Prefeito...
Segundo Dias Gomes, Paulo Gracindo não queria interpretar Odorico e sim o personagem de Jardel, por temer que o personagem Tucão, de Bandeira 2, o estereotipasse. Também Daniel Filho, na introdução do dvd, afirma que por ter sido a primeira novela em cores, algumas cenas ficavam esgaçadas pelo contraste de cores.
Há destaque para dois atores negros. Pela primeira vez Ruth de Souza não faz uma empregada doméstica, a sua Chiquinha é assistente do Doutor Juarez... e Zelão, pescador e seu marido, deseja voar, numa alusão clara a libertar-se das opressões...

A primeira cena, aliás, se divide entre a festa de Iemanjá e a da missa católica, a igreja fica vazia do dia 2/2...
Embora a novela tenha sido gravada em Sepetiba, havia algumas cenas no Rio de Janeiro e em Salvador. Vemos uma Ipanema muito diferente, assim como a Copacabana de 1973.
Já andei dando uma olhada nas próximas. A abertura de Selva de Pedra é muito interessante, já viram?

 E Pecado Capital recuperou a antiga fábrica Nova América, hoje, Shopping. Era lá que as irmãs Lucinha (Betty Faria) e Emilene (Elisângela) trabalhavam, mas isso é papo para um próximo post.